Um herói na cadeira de rodas
Havia um homem de 38 anos, que tinha enormes cicatrizes no rosto. Seu nome era Guilherme. Suas cicatrizes eram tão salientes que lhe deformavam a face. Em qualquer ambiente social em que ele entrava as pessoas ficavam chocadas com a sua aparência. Além disso, era paraplégico, andava numa cadeira de rodas. Guilherme era pai de Rodolfo, um garoto de 14 anos.
O jovem Rodolfo morria de vergonha que as pessoas vissem o rosto mutilado do seu pai. O menino cresceu tentando escondê-lo. Não convidava seus amigos para freqüentar sua casa, não o chamava para participar das reuniões e festividades da escola. O pai percebia as reações do seu filho e se calava.
Certa vez, Rodolfo contraiu uma forte gripe e faltou à aula. Nesse dia, um professor pediu para os alunos fazerem um trabalho em grupo que deveria ser entregue no dia posterior. Era uma luta contra o relógio. O grupo de Rodolfo, preocupado com a urgência do trabalho, apareceu de supetão na casa dele para avisá-lo. A mãe os recebeu e os introduziu na sala. Em seguida, foi chamar Rodolfo, que estava em seu quarto.
De repente, apareceu o senhor Guilherme numa cadeira de rodas. Ao olhar a sua face, os alunos receberam um choque. Em seguida, apareceu Rodolfo, que ficou abalado ao ver seus colegas com os olhos vidrados na face de seu pai.
— Não se preocupem, eu sei que sou bonitão! — disse o senhor Guilherme, bem-humorado, tentando dissipar o espanto do seu filho e de seus colegas.
Eles sorriram, mas Rodolfo não relaxou. Queria fugir da sala, mas não era possível, o drama era inevitável. Seus colegas perceberam a doçura de um homem mutilado pela vida. Rodolfo estava tão acostumado a ver os defeitos exteriores do seu pai que nunca o enxergara como uma pessoa sociável e cativante. Seus preconceitos impediam-no de ver a beleza escondida atrás das cicatrizes do seu pai.
Enquanto faziam o trabalho, os alunos tiveram algumas dúvidas. Resolveram pedir ajuda para o senhor Guilherme, que prontamente os atendeu e os deixou admirados com sua fantástica cultura. Ele lia mais de um livro por semana. Após terminar o trabalho, os colegas de Rodolfo gostaram tanto do seu pai que continuaram fazendo perguntas a ele. De repente, alguém fez uma pergunta fatal.
— Por que o senhor está numa cadeira de rodas? Como surgiram essas cicatrizes?
Rodolfo ficou vermelho, desejou esconder-se debaixo do sofá. Guilherme e sua esposa guardavam um segredo a esse respeito. Sabiam que um dia teriam de contar a verdade para Rodolfo. Esperaram que ele crescesse. Ultimamente os pais comentavam que seu filho já podia saber o segredo, mas não decidiram o momento.
Diante da pergunta feita por um dos alunos, os pais de Rodolfo se entreolharam. A mãe movimentou a cabeça e fez um sinal para o senhor Guilherme, estimulando-o a contar um dos mais importantes capítulos da sua história.
Com a voz embargada de emoção, o pai começou a contar uma intrigante história:
— Meu filho, quando você tinha dez meses de idade, fomos passear num hotel-fazenda. O hotel era lindo, todo feito de madeira. Eu e sua mãe fomos fazer uma longa caminhada e deixamos uma babá cuidando de você. De repente, vimos ao longe labaredas de fogo na direção do hotel.
Após uma pausa, o senhor Guilherme continuou:
— Apressadamente, fomos ao local e vimos o hotel em chamas. O fogo havia-se alastrado rapidamente. Procuramos você e não o achamos. Ao ver a babá sozinha, entramos em pânico. Ela o havia abandonado para ir à piscina e teve medo de entrar no hotel para resgatá-lo. O tumulto era grande. As estruturas ameaçavam desabar.
Rodolfo estava atônito. Parecia estar vendo a cena.
— Desesperado, tentei entrar no hotel. Algumas pessoas me seguraram dizendo que era loucura, pediram-me para esperar os bombeiros que em breve chegariam. — E fitando, Rodolfo, seu pai acrescentou: — Sua vida era mais importante que a minha. Poderia morrer, mas lutaria por você.
O filho não suportou. Começou a chorar diante dessa dramática história. Nesse momento, uma colega o abraçou. O senhor Guilherme continuou:
— O calor era insuportável. Comecei a tossir muito. Em meio à fumaça e ao fogo eu felizmente o alcancei. Você chorava inconsolado. Eu o abracei, o protegi e bati em retirada. Quando estava para sair do hotel, tropecei num objeto no meio do caminho. Os bombeiros, que haviam chegado, o resgataram, mas, antes que me socorressem, uma viga central desabou sobre minhas costas, fraturando minha coluna. Com a queda, meu rosto tocou em brasas vivas e se queimou.
O senhor Guilherme parou a narrativa para enxugar suas lágrimas. Em soluços, ele disse com sensibilidade inigualável:
— Eu sei que as pessoas se espantam com minha face. Mas as cicatrizes que abalam as pessoas é o sinal do amor intenso que tenho por você.
Rodolfo, que havia derramado algumas lágrimas, começou a chorar em voz alta. Se antes sentia vergonha do rosto deformado do seu pai, agora estava sentindo vergonha do seu egoísmo. Em prantos, perguntou:
— Por que vocês não me contaram essa história antes?
— Eu e sua mãe resolvemos não lhe contar a verdadeira história para que você nunca achasse que por sua causa eu sou um paralítico e deformado. Queríamos que você vivesse a vida intensamente e sem traumas. Tinha medo de que você não voasse alto, por ter pena de mim. Não queria que sua história fosse amarrada nas minhas limitações e em meus sofrimentos. Se eu errei, perdoe-me.
Rodolfo recordou de todas as vezes que tentava esconder seu pai dos seus amigos. Ele conhecia suas cicatrizes, mas não o conhecia por dentro. Entendeu que foi injusto e superficial. Profundamente arrependido, saiu da condição de um filho comum para ser um filho brilhante. Olhou nos olhos do seu pai e, como se visse o cerne do seu coração psíquico, expressou:
— Papai, eu é que peço perdão. Eu não o conhecia, mas agora meus olhos o vêem. Eu tinha vergonha de você, mas agora vejo que por detrás dessas cicatrizes há um herói que me amou intensamente e lutou por mim com todas as suas forças — falou Rodolfo, num profundo estado de imersão emocional.
Os seus colegas também não contiveram a comoção. Olharam para suas vidas e, num momento de reflexão, descobriram que conheciam pouco os seus próprios pais.
Em seguida, o jovem Rodolfo levantou-se e abraçou seu pai como nunca o fizera. Raramente um abraço foi tão comovente. Depois desse gesto, fez outro gesto que seu pai jamais imaginou que fizesse: beijou as suas cicatrizes.
O pai sabia que o filho o desprezava, mas tinha esperança de que um dia ele retornaria para seus braços. As imperfeições da face do seu pai, que lhe causavam aversão, tornaram-se a fonte mais excelente de orgulho. Desse modo, tornaram-se grandes amigos, escreveram uma nova história.
História extraída do livro: "Filhos Brilhantes, Alunos Fascinantes" de Augusto Cury
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Como você tem tratado seus pais?
Já pensou sobre tudo que eles fizeram e renunciaram por você?
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